A icônica marca britânica Burberry causou um grande alvoroço na mídia por ter destruído US$ 40 milhões em roupas, acessórios e perfumes no ano passado. Muitos ficaram indignados dizendo que a empresa deveria ter liquidado ou doado os produtos para caridade mas para uma grife de luxo como a Burberry, as coisas não são tão simples assim.  A empresa admitiu ter destruído os produtos não vendidos, em vez de vendê-los a preços baixos, a fim de proteger a exclusividade e o valor da marca.

A fundadora e diretora de criação da Fashion Revolution, Orsola de Castro, pediu uma mudança nos hábitos de compra e uma mudança do modelo de produção em massa. Orsola reconheceu que a prática de destruição de estoques é bastante difundida, tanto por grandes marcas de luxo como de fast fashion, o que sugere um descompasso alarmante entre a produção e a venda de artigos de moda. Orsola de Castro disse:

“A prática de destruir produtos é bastante difundida em todo o setor. É uma consequência direta da produção em massa, e muitas outras marcas de luxo e marcas populares estão fazendo isso também. Produzimos de 100 a 150 bilhões de peças de vestuário a cada ano e, como resultado direto, estamos vendo enormes quantidades de excedente em toda a cadeia de suprimentos da moda. Precisamos resolver esse problema na fonte; Precisamos de maior transparência em toda a cadeia de suprimentos da moda. A falta de transparência na cadeia de valor da moda nos impede de ver exatamente quanto desperdício e excedente são criados, onde este desperdício e excedente são produzidos e como são descartados e o impacto que tem no meio ambiente.”

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Orsola de Castro também abordou a questão da reciclagem, sugerindo que, embora se fale de circularidade e de circuito fechado, “ainda não chegamos a soluções realistas e efetivas de reciclagem de roupas em massa”.

Ela acrescentou: “Mais energia deveria ser gasta em soluções interativas criativas como upcycling e recycling e uma mudança cultural de produção em massa e consumo de massa para uma produção mais moderada levando a consumo consciente, melhor cuidado e uma abordagem menos descartável de marcas e consumidores. As pessoas que compram de varejistas precisam ter uma conversa diferente com as marcas. Melhorar a maneira como compramos, cuidamos e descartamos nossas roupas é responsabilidade de todos, e isso requer uma mudança em nossos próprios hábitos pessoais de compra.”

Ela está certa, no entanto, a questão é que o modelo de negócios do fast fashion é baseado em acionistas, estimulando uma produção excessiva para aumentar continuamente os lucros, e assim gerar dividendos mais altos. Não há incentivo para que as grandes marcas de fast fashion desacelerem, e em muitos casos, seria um suicídio comercial mudar para o sistema slow fashion. As pequenas marcas de moda geralmente trabalham em níveis de estoque muito mais baixos do que os grandes varejistas, de modo que seu estoque de resíduos deve ser menor. A Zara trabalha com um modelo similar, comprando pequenos lotes de roupas no início da temporada e analisa o interesse do cliente para saber quanto mais deverá produzir.

Grandes marcas de moda têm maiores níveis de estoque e tendem primeiro reduzir os preços para vender seu produto, depois reciclar ou revender o que resta. Em alguns casos, empresas externas especializadas em movimentação de mercadorias não vendidas são contratadas por alguns varejistas. Outros adotaram iniciativas para doar roupas indesejadas a ONGs e empresas sociais.

Mas os ativistas ambientais dizem que o problema dos resíduos da moda é muito maior do que o estoque não vendido. Eles culpam a modelo de fast fashion pela alta taxa de consumo de moda, impulsionada pela quantidade de roupas novas de baixa qualidade que são colocadas à venda para serem descartadas rapidamente e perpetuar o ciclo. Uma pesquisa realizada pela Ellen MacArthur Foundation sugere que a produção global de roupas dobrou nos últimos 15 anos, com as roupas, em média, sendo usadas muito menos e sendo descartadas mais rapidamente do que nunca.

Orsola de Castro diz que “não existe uma maneira ambientalmente amigável de queimar roupas”. Parte disso tem a ver com os materiais. : “Muitas desses produtos contêm peças como revestimentos sintéticos ou zíperes e botões que são de plástico. Você pode queimar plástico, mas não vira cinza. Queimar roupas para gerar energia não é uma desculpa muito boa, porque produzi-las em primeiro lugar, consume muita energia. Simplesmente não faz sentido.”

Apesar das possíveis implicações ambientais, para as grandes marcas, a queima de produtos excedentes pode ser mais fácil, e mais barato, do que encontrar novos usos para eles. Mas também é importante notar que o desperdício não ocorre apenas quando uma marca projeta erroneamente suas vendas e acaba fabricando mais unidades do que pode vender, isso acontece durante todo o processo de fabricação.

“O descarte incorreto de roupas acontece em toda a cadeia de fornecimento”, diz Orsola, “das tecelagens aos fabricantes” em quantidades brutas. “O que acontece com o produto acabado é literalmente a ponta do iceberg.” O que é interessante de notar nisso tudo é que os consumidores das gerações Y e Z, que se dizem tão preocupados com a sustentabilidade na moda, são os maiores causadores desse excesso de produção e descartabilidade, pois afinal, quem impulsiona e consome as novas tendências através das redes sociais? Não são os consumidores que buscam novidades o tempo todo? As empresas de moda só atendem a demanda.

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Renato Cunha
O blog Stylo Urbano foi criado pelo estilista Renato Cunha para apresentar aos leitores o que existe de mais interessante no mundo da moda, artes, design, sustentabilidade, inovação, tecnologia, arquitetura, decoração e comportamento.

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